Presidente do IBEVAR analisou cenário macroeconômico brasileiro para 2023 e refletiu sobre o risco de crédito ao varejo representado pela inadimplência
Lucas Torres
Ao encerrar 2022 com sua nona alta consecutiva, a inadimplência atingiu um número de 68,39 milhões de brasileiros. De acordo com dados do Serasa Experian, o cartão de crédito é, digamos, o principal ‘vilão’ deste processo – atingindo 53% do total de endividados.
Para o varejo, este cenário já geraria uma preocupação automática. Afinal, historicamente um cenário de alta na dívida das famílias reflete a diminuição no poder de compra.
Esta noção tácita, no entanto, é ainda mais agravada quando nos deparamos com o perfil atual da dívida dos cidadãos locais. Ao estratificar o levantamento por segmentos de consumo, o Serasa Experian identificou que a maior parte das dívidas atuais foi adquirida na hora de atender necessidades básicas: 65% delas em supermercados, na compra de alimentos.
Em entrevista exclusiva para o NovoVarejo, o presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo & Mercado de Consumo (IBEVAR), Claudio Felisoni analisou a inadimplência inserida dentro do contexto macroeconômico do país e apontou o risco de crédito representado pelo cenário ao varejo nacional.
Ao fim da análise, o especialista deixou uma mensagem positiva para os varejistas brasileiros. Afinal, em meio a todas as questões sensíveis do ambiente econômico nacional, a expectativa é que o setor ainda consiga apresentar crescimento ao longo de 2023.
Confira abaixo a íntegra da entrevista.
Novo Varejo – Você acredita que a alta taxa de endividamento das famílias brasileiras pode desembocar em uma desaceleração do varejo no ano de 2023?
Claudio Felisoni – O crescimento do varejo depende essencialmente das seguintes variáveis: renda real (nominal descontada a inflação), taxa de juros, emprego e inadimplência. Somente a inadimplência corrente não limita o consumo, porém as expectativas para 2023 ainda são muito incertas. Essa incerteza associada às possibilidades de aceleração da inflação e ao endividamento das famílias podem em conjunto restringir fortemente o consumo de bens e serviços.
Novo Varejo – Neste momento de inadimplência, alguns consumidores buscam alternativas de crédito de ‘menor exigência’ – como os carnês, por exemplo. O que o varejista de pequeno e médio porte precisa avaliar antes de oferecer estas modalidades ‘alternativas’?
Claudio Felisoni – Claro que em situações como a descrita o risco de crédito aumenta substancialmente. O processo de concessão de crédito é complexo, ou seja, não é absolutamente trivial. Existe modelagem específica para atender essa finalidade. Entretanto, para os pequenos varejistas esses recursos muito provavelmente não estão disponíveis.
O que se pode recomendar nesses casos é redobrar os cuidados na concessão de crédito. Uma ficha com informações detalhadas sobre o comprador e consultas sobre o comportamento pregresso de compra dos interessados são providências essenciais. É importante também fazer uma reserva financeira visando cobrir a inadimplência.
Novo Varejo – Você acredita que a manutenção ‘permanente’ do auxílio de R$ 600,00 pode amenizar o impacto atual da inadimplência e servir como um motor para o consumo neste ano?
Claudio Felisoni – Sim. A exemplo do que aconteceu anteriormente.
Novo Varejo – Quais são os segmentos do varejo que mais devem sofrer pelo alto índice de inadimplência e possível escassez de crédito dos consumidores?
Claudio Felisoni – São os segmentos do varejo que têm o desempenho das vendas muito associado às condições de financiamento, isto é, principalmente os bens duráveis: eletroeletrônicos, eletrodomésticos, automóveis, etc.
NovoVarejo – De maneira geral, qual a sua expectativa para o setor varejista em 2023?
Claudio Felisoni – Penso que será, provavelmente, um ano com crescimento. Porém, este crescimento deve ser bem discreto e impulsionado principalmente pelo auxílio de R$ 600,00.