Professores da FEA USP e porta-vozes do Ibevar, José Carlos de Souza Filho e Marcelo Felippe Figueira Júnior detalharam e projetaram os impactos da Emenda Constitucional que, aprovada pelo Congresso Nacional, altera o Sistema Tributário Brasileiro
Foi publicada em 20/12/2023 em sessão do Congresso Nacional, a Emenda Constitucional que altera o Sistema Tributário Nacional trazendo grandes inovações, principalmente no que diz respeito aos tributos sobre a circulação de mercadorias através da PEC 45/2019, ora transformada na EC 132.
Grande parte dessas mudanças já foi e tem sido objeto de amplo debate na imprensa generalista, neste trabalho – porém – os especialistas imprimiram suas percepções sobre as mudanças mais significativas que entrarão no radar de empresariado do varejo daqui até o início da próxima década. Confira:
Criação de um IVA dual
Criação de um IVA dual, dividido em Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência dos Estados, Municípios e Distrito Federal, e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União (esta, com característica de contribuição social, prevista no artigo 195 da Constituição). Estes tributos:
Regras para fatos geradores
Compartilharão regras referentes a fatos geradores, bases de cálculo, imunidades, regras de não cumulatividade e de creditamento, etc. Incidirão sobre operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviços, inclusive sua importação.
Deverão ser regulados por norma uniforme em todo o território nacional, ressalvado o direito de cada Estado de fixar sua própria alíquota. Serão não-cumulativos.
Sem integração da base de cálculo
Não integrarão sua própria base de cálculo, nem a de cada outro, assim como do PIS, COFINS, PIS/COFINS-Importação e do Imposto Seletivo (dispositivo que os excluía da base de cálculo do ICMS e do ISS foi excluído da redação final).
Por outro lado, IPI, ICMS, ISS, PIS, COFINS e POS/COFINS-Importação não integrarão a base de cálculo do IBS e da CBS. Vale observar que a tributação atual não é sua essência, cumulativa, na medida em que o ICMS, o PIS e a COFINS são calculados sobre o valor adicionado.
Porém, a diferença é que os tributos serão excluídos da base de cálculo posterior na cadeia. Espera-se que a cobrança seja feita apenas no destino, mas isto dependerá de Lei Complementar e provavelmente de muita negociação entre os estados;
Alíquota zero
Incidirão à alíquota zero sobre os produtos da Cesta Básica Nacional de Alimentos, a serem definidos por Lei Complementar. Terão a alíquota reduzida em 60% (sessenta por cento) para uma série de produtos e serviços, a serem fixados por Lei Complementar de acordo com os critérios da norma constitucional.
Terão a alíquota reduzida em 30% (trinta por cento) para serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, desde que sejam submetidas a fiscalização por conselho profissional.
Comitê Gestor
O IBS, especificamente, estará sujeito à regulamentação e administração por parte do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços, com participação paritária dos Estados, Distrito Federal e Municípios, na forma de lei complementar.
Está prevista a participação do DF, dos 26 estados e de 27 municípios neste Comitê Gestor, o que deverá reduzir a efetividade da participação relativa dos mais de 5.570 entidades municipais na divisão da parcela relativa ao ISS no IBS.
Cobranças a partir de 2026
Começarão a ser cobrados em 2026, às alíquotas iniciais de 0,1% (um décimo por cento) para o IBS e de 0,9% (nove décimos por cento) para a CBS, com evolução gradual até a extinção do ICMS e do ISS a partir de 2033.
- Criação do Imposto Seletivo, de competência da União e incidente sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos de lei complementar. Este tributo, monofásico, integrará a base de cálculo não apenas do IBS e da CBS, mas também do ICMS e do ISS, enquanto vigorarem. Este tributo se assemelhará ao Excise Tax existente em outros países como Estados Unidos e Canadá;
- Estabelecimento de regras gerais e de diretrizes a serem estabelecidas por lei complementar, visando o aproveitamento de saldos credores de ICMS acumulados até 2032. Aqui se tem uma acomodação sobre os débitos e créditos remanescentes dos tributos que deixarão de existir com o início da nova tributação;
- Transferência da cobrança do ITCMD “causa mortis”, do Estado onde se processar o inventário ou arrolamento para o do domicílio do de cujus (regra aplicável às sucessões abertas a partir da data de publicação da Emenda Constitucional);
- Estabelecimento da regra de incidência progressiva do ITCMD, em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação;
- Incidência do ITCMD, até que lei complementar regule sua incidência sobre doações e heranças envolvendo bens, doadores ou falecidos no exterior: (i) relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal; (ii) se o doador tiver domicílio ou residência no exterior, ao Estado onde tiver domicílio o donatário ou ao Distrito Federal, ou, se este for residente ou domiciliado no exterior, ao Estado em que se encontrar o bem ou ao Distrito Federal; (iii) relativamente aos bens do de cujus, ainda que situados no exterior, ao Estado onde era domiciliado, ou, se domiciliado ou residente no exterior, onde tiver domicílio o sucessor ou legatário, ou ao Distrito Federal;
- Extensão da incidência do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para a propriedade de veículos aquáticos e aéreos, exceto hipóteses específicas de emprego comercial destes;
- Possibilidade de atualização da base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) pelo Poder Executivo, conforme critérios estabelecidos em lei municipal;
- Possibilidade de instituição, pelos Municípios e o Distrito Federal, de contribuição para o custeio, a expansão e a melhoria do serviço de iluminação pública e de sistemas de monitoramento para segurança e preservação de logradouros públicos.
O varejo será diretamente afetado
Nota-se que nas principais medidas adotadas até o momento, o varejo será diretamente afetado, uma vez que os principais tributos que foram objeto da reforma ora promulgada se referem ao consumo representado pelo comércio e pelos serviços.
Ainda existem muitos pontos a serem debatidos, discutidos e decididos e que vão definir efetivamente as mudanças esperadas pelas empresas e pela sociedade. Questões como a progressividade dos tributos sobre as vendas em relação à renda, qual será o destino da Substituição Tributária (e do DIFAL) que deveriam deixar de existir e o tratamento que será destinado às pequenas e médias empresas hoje amparadas pelo SIMPLES preocupam uma boa parte do varejo.
Com o passar do tempo, medidas paliativas foram sendo tomadas a fim de atenuar a carga tributária dos pequenos negócios e ao mesmo tempo se tentou manter a arrecadação tributária em níveis compatíveis com a redução do déficit fiscal. Parece que chegou a hora de que essas questões sejam tratadas com compromisso e seriedade.