Evento reuniu especialistas para discutir o uso estratégico de recebíveis, a integração entre plataformas e as novas fronteiras da digitalização financeira do varejo
Em um cenário de transformação acelerada no setor financeiro, o FinTalks reuniu representantes do varejo, fintechs e empresas de tecnologia em Florianópolis/SC, no dia 9 de julho, para discutir como o varejo pode se tornar protagonista na oferta de crédito e na gestão de dados financeiros. Realizado pela Vertical Fintech da Associação Catarinense de Tecnologia (ACATE), o evento teve como foco central as oportunidades trazidas por tecnologias como PIX automático, Open Finance e, especialmente, a bancarização e o uso estratégico dos recebíveis de cartão como instrumento de crédito.
No centro das discussões, nomes como Jaison Goedert (Magazord), Ronaldo Oliveira (Giro.Tech), Adriano Joaquim (Cartular) e Pablo Lima (TAG IMF) compartilharam experiências práticas sobre como varejistas estão se fintechzando para ampliar margens, controlar o capital de giro e criar novas fontes de receita, além da oferta de serviços financeiros para seus clientes e fornecedores.
“As empresas podem ser os novos bancos do futuro. Crédito não precisa vir só de instituições financeiras”, afirmou Ronaldo Oliveira, da Giro.Tech.
Para Ricardo Toledo, diretor da Vertical Fintech da ACATE e mediador do evento, entender como a estrutura financeira pode ser integrada ao core business do varejo é um passo fundamental.
“Quando você pergunta ao cliente como melhorar o fluxo de caixa ou operacional, muitas vezes a resposta já está dentro de casa. As fintechs oferecem meios de transformar essa resposta em produto financeiro”, destacou.
A era da creditização das software houses
Um dos principais destaques do evento foi a Magazord, empresa de tecnologia para e-commerce sediada em Rio do Sul (SC), que iniciou sua trajetória como loja virtual e hoje oferece uma plataforma verticalizada de gestão de vendas online. Segundo seu CEO, Jaison Goedert, cerca de 25% da receita da empresa já vem de soluções financeiras embarcadas na plataforma.
“Acreditamos que estamos entrando na era da creditização das empresas de software. O crédito passa a ser parte do core”, declarou Goedert.
Com uma base de mais de 3 mil clientes, a Magazord tem apostado na antecipação de recebíveis de cartão como forma de oferecer liquidez a lojistas em crescimento rápido, um perfil comum no e-commerce brasileiro, que nem sempre possui histórico bancário suficiente para obter crédito tradicional.
Crédito embarcado, dados e integração: o novo papel dos ecossistemas
A Giro.Tech, especializada em estruturar veículos financeiros personalizados, explicou como tem ajudado empresas como a Magazord a montar suas próprias operações de crédito, com uso de FIDICs e securitizadoras. A operação, segundo Ronaldo Oliveira, tem risco controlado porque o ecossistema da Magazord conhece profundamente o comportamento dos lojistas: vendas, entregas, reputação e inadimplência.
“O banco não sabe se o cliente entregou o produto. O ecossistema sabe. Isso é informação privilegiada transformada em inteligência financeira.”
Para garantir a segurança e a rastreabilidade dessas transações, a Cartular e a TAG IMF explicaram como funciona a infraestrutura de mercado que dá suporte aos recebíveis. Pablo Lima, CEO da TAG IMF, destacou que os dados são registrados em tempo real, com unicidade e direcionamento automático para o domicílio bancário correto, o que evita fraudes e dá previsibilidade ao crédito.
“O recebível de cartão é o ativo mais plástico do mercado brasileiro. Já nasce digital, pertence ao varejista e pode ser usado como lastro de crédito com segurança”, disse Adriano Joaquim, da Cartular.
Infraestrutura regulada e democratização do crédito
A discussão também abordou o papel das registradoras e a evolução regulatória conduzida pelo Banco Central desde 2012. O marco dos recebíveis e o surgimento de novos instrumentos, como a duplicata escritural e o boleto dinâmico, estão abrindo espaço para a oferta de crédito por qualquer empresa com base em ativos performados.
“Hoje, até um MEI pode operar com crédito baseado em recebíveis, desde que esteja conectado à infraestrutura certa”, destacou Joaquim.
A TAG IMF está entre as entidades que operam esse registro, e o avanço para novos formatos, além do cartão, deve permitir que práticas de crédito sejam estendidas para transações com boleto e outras duplicatas formalizadas digitalmente. O objetivo, segundo Pablo Lima, é aumentar a competição e reduzir os custos do crédito no país.
Fintechzação é estratégia, não acessório
Ao longo do evento, os painelistas reforçaram que a fintechzação das empresas, especialmente aquelas com grandes bases de clientes ou sellers, não é apenas uma oportunidade, mas uma necessidade estratégica para manter a competitividade. A oferta de produtos financeiros embarcados melhora margens, fideliza clientes e reduz a dependência de intermediários bancários.
“Quem não fizer, vai perder margem para quem já está fazendo. Fintechzar é proteger o próprio negócio”, concluiu Ronaldo Oliveira.